CRÔNICA
Crônica do Professor Antônio Glauber sobre as notícias do dia 20 de setembro de 2024
O mar avança, as serpentes caem, os professores se inscrevem e os celulares, esses novos demônios da modernidade, ameaçam ser exorcizados das salas de aula.
Por Antonio Glauber Santana Ferreira – Japaratuba-SE
A casa à beira do mar parecia desafiá-lo, mas, como em um duelo desigual, o oceano, incansável boxeador, avançou com golpes silenciosos, derrubando parte da estrutura. A Praia do Saco, em Estância, virou um espetáculo triste onde a linha entre terra e água já não se sabe mais onde começa ou termina. Há dez anos, a faixa de areia era vasta, quase infinita, uma promessa de descanso aos pés dos veranistas. Hoje, o mar, com sua fome insaciável, devora cada centímetro de terreno como se fosse um banquete de domingo. E a casa que cedeu é apenas mais uma peça nesse quebra-cabeça trágico, onde os únicos que parecem não se mover são os governantes, imóveis como pedras, enquanto a água avança e avança, como um relógio de areia invertido.
Enquanto isso, em Aracaju, no alto de um prédio, o tutor de uma jiboia experimenta o sabor amargo do inusitado. A serpente, que talvez tenha decidido explorar as alturas como uma turista desavisada, caiu do oitavo andar. E o tutor, que agora coleciona acusações como quem coleciona figurinhas de um álbum sombrio, tentou recuperar a guarda da ofídia. Mas a justiça negou, lembrando que a liberdade não combina com répteis em apartamentos. Parece que, nesse caso, o crime não foi só contra a serpente, mas contra o bom senso, esse bicho raro que anda em extinção.
Em meio a esse turbilhão, a Secretaria Municipal da Educação de Aracaju abriu inscrições para um concurso público, oferecendo 425 vagas para professores. É como se, em um momento de claridade, alguém tivesse percebido que, entre tantas serpentes que caem e mares que avançam, precisamos de quem nos ensine a ler a vida. O magistério, essa nobre arte de iluminar mentes, ganha novos sopros de esperança. Mas, como todo bom suspense, a trama tem seu revés: as inscrições só vão até o dia 21 de outubro. É como se a Semed nos dissesse: “Corram, a fila anda e o mundo não espera”. Porque, enquanto professores tentam plantar sementes de sabedoria, o mundo parece em descompasso, como uma orquestra sem maestro.
O MEC, em sua eterna luta para impor ordem ao caos, agora quer banir os celulares das escolas. Um projeto de lei em andamento, inspirado por um relatório da Unesco, visa proibir o uso desses aparelhos que, ao invés de conectar, distraem. Mas será que alguém perguntou aos alunos o que acham disso? Os jovens, mestres em navegar por águas digitais, talvez vejam nos celulares mais que um simples vício, mas um grito de liberdade em um mar de disciplinas. E se banirmos os celulares, o que virá depois? Baniremos também as ideias, os sonhos, a capacidade de questionar? O MEC quer silêncio nas escolas, mas é preciso tomar cuidado para não transformar o silêncio em conformismo.
Enquanto isso, o governo federal redefiniu as infrações ambientais e atualizou os valores das multas. Queimar florestas agora custa R$ 10 mil por hectare. Parece um preço justo para quem quer transformar um pedaço de vida em cinzas. Mas será que multas são suficientes para frear a ganância dos que veem na natureza apenas um saldo bancário? O meio ambiente continua sendo tratado como uma espécie de primo pobre, que só é lembrado quando incomoda, quando não há mais como ignorá-lo. Mas a natureza, ao contrário do que muitos pensam, não negocia; ela reage. E cada árvore que cai, cada incêndio que se alastra, é uma advertência para quem ainda acha que dá para negociar com o inevitável.
Para fechar o dia, o voo que teve que pousar na Dinamarca por conta de um passageiro clandestino inusitado: um rato. Imaginem a cena: o roedor, talvez em uma de suas andanças noturnas pelo avião, apareceu na refeição de uma passageira. E, como em um desses contos de Kafka, o que era um voo tranquilo virou um caos aéreo. A companhia prometeu reforçar os protocolos para evitar que isso aconteça novamente. Mas quem vai reforçar os protocolos para que coisas assim não aconteçam também aqui embaixo, no nosso voo diário pela vida? O rato no avião é só um sintoma de um problema maior: estamos todos voando às cegas, com destino incerto e companhia duvidosa.
No final das contas, o mar avança, as serpentes caem, os professores se inscrevem e os celulares, esses novos demônios da modernidade, ameaçam ser exorcizados das salas de aula. E nós? Nós seguimos, tentando dar sentido ao caos, navegando como ratos em um avião, esperando, quem sabe, uma aterrissagem forçada que nos acorde desse sono profundo.
E se cada notícia é uma metáfora, que esta crônica seja um convite para refletir: quem é, afinal, o verdadeiro clandestino nesta história toda?